Profissional de cibersegurança surda revela desafios da área para quem é PCD: ‘Ainda temos barreiras de comunicação’
Postado em: Por: Raimundo Carvalho
Carioca Daniela Cristina Guidugli conta ao g1 como é trabalhar com uma das profissões mais promissoras e bem remuneradas da tecnologia da informação (TI).
A admiração da analista de segurança da informação Daniela Cristina Guidugli, de 37 anos, pela tecnologia vem desde a infância, observando seu pai consertar de tudo, de celular a televisor.
Tanto que considerou ciência da computação como uma de suas opções de graduação. Mas, no fim, ela decidiu por administração. Daniela é uma pessoa com deficiência auditiva e sentiu que administração seria mais fácil para estudar e de se inserir no mercado de trabalho.
Guidugli nunca fez faculdade de TI e só agora começou a estudar rede de computadores. Ela migrou para a segurança em 2009. Antes disso, entre 2003 e 2008, trabalhou com administração no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), em um hospital e, também, na Marinha do Brasil, no Rio de Janeiro, sua cidade natal.
Ao final da faculdade de administração, ainda em 2008, Daniela fez um curso de tecnologia na ONG Universidade Livre para Eficiência Humana (Unilehu), focada em promover a inclusão de pessoas com deficiência no trabalho.
À época, graças à parceria da Unilehu com o banco HSBC, Guidugli teve a sua primeira oportunidade com segurança da informação, trabalhando na instituição financeira por quase 7 anos — até ser demitida por corte de custo.
“No banco, foi muito difícil porque não tinha nada de acessibilidade e todo mundo só falava por telefone. Às vezes, precisavam me ligar, mas eu não podia falar. Eu tinha que pedir para mandar e-mail ou, então, tinham pessoas maravilhosas que me ajudavam”, relata.
Com a demissão no banco, a partir de 2015, Daniela conta que passou a se dedicar exclusivamente aos cuidados da filha, hoje com 11 anos, e que também é surda. Ela ficou sem trabalho por 5 anos, mas seguiu estudando sobre cibersegurança.
“Lá em 2008, as capacitações não eram acessíveis. Meus colegas evoluíram e eu me sentia estagnada por falta de estudo e atualizações do mercado”, conta.
Segundo ela, a coisa começou a mudar durante a pandemia de Covid-19, quando as empresas passaram a investir mais em acessibilidade. “A partir de 2020, evoluí bastante como profissional”, diz.
Um mês antes da pandemia de Covid-19 começar, Daniela voltou ao mercado de trabalho, em uma fintech brasileira de soluções de pagamento, no cargo de analista de segurança da informação júnior. Lá, ficou quase um ano, até ser chamada para trabalhar na prefeitura de Curitiba (PR).
Hoje, morando na capital paranaense, onde conheceu o seu marido, que é surdo, Guidugli chegou a se preparar para concursos públicos, isso durante o período em que esteve fora do mercado.
“Eu fui ser servidora pública para trabalhar com melhorias de políticas públicas e acessibilidade para surdos. Só que não tinha nada de tecnologia, então saí depois de 1 ano”, conta.
Após pedir demissão, a profissional voltou a ser analista de segurança da informação júnior na mesma fintech de pagamento, onde ficou por seis meses. Desde setembro de 2022, vem trabalhando em outra instituição financeira, mas, desta vez, como analista pleno, ganhando mais. O valor não foi divulgado.
Seu objetivo no momento é seguir estudando para alcançar novos horizontes nesse mercado. “Como é uma área que eu me identifiquei muito, nunca cogitei desistir dela por causa da minha deficiência. Agora eu penso em me preparar para alcançar uma liderança significativa”.
“Mas a realidade ainda não é perfeita. Temos barreiras de comunicação e de informação, e há muito o que conscientizar. Eu só conheço dois surdos que trabalham com segurança da informação”.
Esta reportagem faz parte da série “Carreira em tecnologia: segurança da informação”, do g1. Com base em relatos de profissionais, professores, executivos de grandes empresas e associações que representam o setor, a série mostra como está o mercado de cibersegurança no Brasil.
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